Avaliação da Cadeia de Valor da Energia Eólica Offshore e Comparativo com Petróleo Offshore no Brasil
1. Energia Eólica Offshore (EO) no Brasil: Potencial e Desafios
O Brasil está emergindo como um player significativo no cenário global de
energia eólica offshore, com um enorme potencial e diversas iniciativas em
andamento para desenvolver a sua cadeia de valor.
1.1. Estado Atual e Potencial
• Capacidade Projetada: O Brasil já tem "intenções de instalação de uma potência da ordem
de 176 GW" de energia eólica offshore em licenciamento junto ao IBAMA até
dezembro de 2022, o que é "mais que o triplo da potência instalada
acumulada em todo o mundo".
• Competitividade de Custos (LCOE): Atualmente, o Custo Nivelado de Energia (LCOE) para projetos de EO
no Brasil é de 333 R$/MWh, não competitivo com outras renováveis (ex:
onshore e solar fotovoltaica, abaixo de 150 R$/MWh). No entanto, projeções
indicam que a EO pode se tornar competitiva com usinas marginais na década
de 2030, atingindo um LCOE entre 189 R$/MWh e 105 R$/MWh em 2050,
dependendo do desenvolvimento da cadeia de valor.
• Geração de Empregos: A energia eólica offshore tem o potencial de gerar entre "11 até 34
empregos por MW instalado de eólica offshore em cada ano no Brasil",
totalizando "72 e 163 mil empregos em 2050" em cenários de pleno
desenvolvimento. Há uma "boa sobreposição de habilidades" entre a
indústria de óleo e gás offshore e a energia eólica offshore, facilitando
a transição de mão de obra.
• Benefícios Socioambientais: A EO é uma "alternativa energética renovável, de baixa emissão de
gases do efeito estufa, que pode contribuir para que o Brasil alcance as
metas climáticas de carbono zero". Além disso, pode "contribuir para
atividades paralelas, como o turismo e a aquacultura" e gerar "bem-estar
social para a população."
1.2. Desafios para o Desenvolvimento
• Infraestrutura de Transmissão: Os principais desafios incluem a localização dos projetos, o
desalinhamento entre os cronogramas de geração e transmissão, a
propriedade e obrigações da infraestrutura de transmissão marítima e os
aspectos ambientais da transmissão. Embora a regulação brasileira ofereça
ferramentas, o planejamento da transmissão para a EO ainda é
complexo.
• Infraestrutura Portuária e Logística: Nenhum porto brasileiro está "completamente pronto para a operação
plena e imediata na montagem de parques eólicos offshore", mas a
infraestrutura portuária existente, com devida capacitação, é "suficiente
para atender a demanda de forma mais rápida e a um menor custo".
Adaptações são necessárias, especialmente no aumento da capacidade de
carga dos cais, áreas de armazenagem e resistência do solo. (ABEEólica, p.
8, 13-15) A cabotagem é o modal de transporte preferencial para as grandes
dimensões e pesos dos componentes.
• Disponibilidade de Componentes e Materiais: A cadeia de suprimentos do Brasil "exigirá amplo desenvolvimento
para capturar o máximo de benefício local". Embora o Brasil tenha
experiência com óleo e gás offshore, eólica onshore e construção civil, a
fabricação e beneficiamento de materiais como aço, cobre e terras raras
ainda são limitações. Há uma "oportunidade para os pioneiros do setor
desenvolverem as capacidades no Brasil".
• Inovações Tecnológicas: O setor de EO é dinâmico, com inovações constantes em turbinas
(maiores e mais potentes, materiais recicláveis), fundações (monopile,
jacket, flutuantes), infraestrutura elétrica (tecnologias de cabos como
LFAC, subestações flutuantes) e operações/manutenção (automação,
digitalização, IA). O Brasil precisa continuar inovando e aproveitando o
potencial em águas mais profundas para reduzir custos.
• Financiamento: Embora o interesse internacional seja grande e o custo de capital
esteja reduzindo, ainda não existem modelos específicos para financiamento
de projetos de EO no Brasil, e os bancos públicos de fomento não definiram
diretrizes claras. O BNDES tem um papel relevante no financiamento de
renováveis e o "ambiente e a lógica atuais de financiamento do setor
elétrico brasileiro tendem a ser aderentes às necessidades da indústria
eólica offshore."
• Regulação: O arcabouço regulatório da EO no Brasil foi impulsionado pelo
Decreto nº 10.946/2022 e portarias complementares, visando celeridade.
Contudo, ainda faltam definições como a "metodologia de cálculo do valor
pelo uso do bem público" e o "limite máximo de área cedida em um mesmo
contrato", além da metodologia de seleção e critério de julgamento para o
processo de cessão das áreas. A aprovação de uma lei traria maior
segurança jurídica.
• P&D e Capacitação de Mão de Obra: Especialistas apontam a necessidade de P&D em mapeamento de
recursos eólicos offshore, competitividade, impactos ambientais,
transmissão e regulação. A capacitação de mão de obra é avaliada entre
média e boa, com a necessidade prioritária de "Profissionais CTEM
(Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática)" e "Profissionais de
Operações Offshore".
2. Indústria de Petróleo Offshore no Brasil: Contexto e Impactos
A indústria de petróleo offshore tem sido uma força motriz na economia
brasileira, mas com significativos impactos ambientais e desafios.
2.1. Relevância e Produção
• Alta Produção Offshore: Cerca de "90% da produção [de petróleo no Brasil] é offshore", com
grande parte em águas profundas.
• Reservas Significativas: O Brasil tem "grandes reservas petrolíferas que podem continuar
sendo exploradas comercialmente."
• Impacto Econômico: Em 2023, o setor gerou "R$97B em participações governamentais" e
"R$42B em participações governamentais para o Estado e os municípios do
RJ", incluindo Macaé. Também houve "R$4B em obrigações de investimentos em
PD&I".
• Refino e Importação: Apesar de estar entre os "10 maiores exportadores de petróleo bruto
do mundo" (9º lugar em 2023, com 1,6 milhão bpd), o Brasil ainda "é
necessário importar diesel, gasolina, combustível de aviação e GLP". A
maioria do petróleo não é refinada no país, impedindo sua utilização
direta.
2.2. Impactos Ambientais e Desafios
• Poluição e Vazamentos: A exploração de petróleo offshore gera "elevada" quantidade de
problemas ambientais, incluindo "poluição dos recursos hídricos,
aquecimento global, efeito-estufa, desmatamento, chuvas ácidas, aumento da
produção de resíduos sólidos, degradação ambiental, entre outros".
Vazamentos podem causar "sérios danos ao ecossistema marinho" e
"prejudicar irreversivelmente esses ecossistemas e as comunidades que
dependem deles".
• Riscos de Vazamento: A exploração no Mar do Caribe, por exemplo, "tem um alto potencial
de derramamentos e poluição". Vazamentos anteriores no Brasil, como o da
Baía de Guanabara (2000) e o desconhecido no Atlântico Sul (2019),
demonstraram "consequências significativas no ecossistema".
• Impacto na Biodiversidade: Vazamentos de óleo afetam a "vida selvagem tanto pelo contato
direto com a pele, pelos ou penas, quanto indiretamente por meio da
ingestão, inalação e absorção". Espécies como tartarugas marinhas,
mamíferos marinhos e diversas aves estão em risco.
• Descomissionamento: As instalações offshore estão chegando ao "término de suas
operações", demandando o descomissionamento. Este processo envolve
"fechamento e isolamento dos poços, a retirada de tubulações, cabos
submarinos e módulos, além da desmontagem das plataformas e bases",
seguido pela "limpeza completa da área". Os "altos custos envolvidos" e a
"escassez de dados econômicos sobre descomissionamento no Brasil" são
desafios notáveis. A ANP estima um investimento de "R$ 57,1 Bi" para
descomissionar "6995 poços" entre 2023 e 2027, com a Bacia de Campos sendo
a mais dispendiosa (R$ 39 Bi).
• Riscos Ocupacionais: O trabalho em ativos offshore apresenta riscos como "focos de
incêndio", "riscos radiológicos" (radiação ionizante) e "acidentes ou
qualquer outra situação inesperada que atente contra a vida dos
tripulantes, passageiros ou da própria embarcação".
3. Transição Energética e Segurança Energética
A transição energética global busca sustentabilidade, acessibilidade e
redução de impactos ambientais, impulsionada pelo combate às mudanças
climáticas. A segurança energética envolve o "acesso universal à energia
segura e confiável" e a "disponibilidade ininterrupta de recursos
energéticos a preços acessíveis".
3.1. O Papel da Energia Eólica Offshore na Transição Energética
• Hidrogênio Verde (H2): A EO pode servir como "insumo para a produção de hidrogênio verde
por meio da eletrólise da água". O potencial técnico de H2 a partir de
recursos eólicos offshore no Brasil é de "350,4 Mt/ano no total".
(ABEEólica, p. 25-26) O hidrogênio verde é fundamental para descarbonizar
setores de difícil abatimento de emissões (transportes pesados,
indústria), facilitar o armazenamento de energia renovável variável e
acoplar setores elétrico, transporte e industrial.
• Redução de Emissões de GEE: A EO "desloca a geração das usinas movidas a fontes fósseis,
reduzindo o fator de emissão do sistema elétrico". Pode evitar de "37 a
112 MtCO2" até 2050 em comparação com as emissões do Sistema Interligado
Nacional (SIN) e de "160 e 480 MtCO2" em comparação com termelétricas a
gás de ciclo combinado.
• Complementaridade com Outras Fontes: A EO apresenta complementaridade com recursos hídricos e sinergia
com o setor de petróleo, além de proximidade com os maiores centros
consumidores nas regiões Nordeste e Sudeste do Brasil, melhorando a
qualidade da energia fornecida.
3.2. Alternativas ao Petróleo e Economia Circular
• Biocombustíveis de Microalgas: Microalgas são consideradas uma "alternativa promissora" para
biocombustíveis, com "alta eficiência na conversão da luz solar em
biomassa", "produtividade muito além das obtidas pelas principais culturas
terrestres" e capacidade de produção em "áreas marginais, sem competir com
a produção de alimentos". (UFF, p. 14) Algumas espécies, como Schizochytrium sp., Botryococcus braunii, Nannochloropsis sp. e Neochloris oleoabundans, apresentam teores elevados de óleo (20% a 77%).
• Bioquerosene de Aviação (Bio-QAV): Microalgas têm um "potencial significativo para servirem como uma
fonte promissora de bioquerosene". (UFF, p. 15) O Bio-QAV pode reduzir as
emissões de carbono em "50% a 80% ao longo de seu ciclo de vida". (UFF, p.
28) Há um crescente interesse e pesquisa em torno da utilização desses
organismos, com o mercado global de biocombustíveis de algas projetado
para "9,033 bilhões de dólares até 2027".
• Hidrogênio Verde (H2): Considerado o "combustível do futuro", o H2 verde é produzido por
eletrólise usando eletricidade de fontes renováveis e "libera apenas água
em sua combustão". (UFF, p. 19-20) A "economia do hidrogênio" representa
uma cadeia de valor completa que busca substituir combustíveis fósseis por
fontes de energia sustentáveis com emissão zero de carbono. (UFF, p. 20) O
mercado de H2 verde é estimado em "US$ 2,5 trilhões até 2050", equivalente
à metade do mercado atual de petróleo.
• Economia Circular e Resíduos: A capacidade das microalgas de utilizar "diferentes metabolismos
energéticos" e seu "cultivo em resíduos" (água de reuso da agricultura,
aquacultura, industrial e de municípios) são vantagens, diminuindo custos
operacionais e contribuindo para a proteção ambiental.
4. Conclusões e Recomendações
O Brasil se encontra em uma posição estratégica para liderar a transição
energética global, dada a abundância de recursos renováveis e a maturidade
de algumas indústrias correlatas.
• Prioridade para EO: O desenvolvimento da cadeia de valor da energia eólica offshore é
crucial, não apenas como uma fonte de energia limpa, mas também como um
motor de desenvolvimento econômico e social, gerador de empregos e um
pilar para a produção de hidrogênio verde.
• Superar Desafios Regulatórios e de Infraestrutura: É imperativo que o governo brasileiro finalize o arcabouço
regulatório para a EO, definindo claramente a metodologia de valoração de
áreas e critérios de leilão, e invista na modernização da infraestrutura
portuária e de transmissão.
• Fomento à Indústria Doméstica e P&D: Estimular a adaptação e o desenvolvimento de indústrias locais para
a fabricação de componentes da EO, aproveitando as sinergias com os
setores de óleo e gás, e construção civil, é fundamental. Investimentos em
P&D e capacitação de mão de obra (especialmente em CTEM e operações
offshore) são essenciais.
• Mitigação dos Impactos do Petróleo Offshore: Embora a exploração de petróleo offshore seja vital para a economia
atual, é crucial implementar "políticas ambientais mais rigorosas e
investimentos em fontes de energia sustentáveis" para mitigar os impactos
negativos. O descomissionamento das plataformas de petróleo deve ser
tratado com urgência, clareza regulatória e financiamento adequado.
• Diversificação e Inovação: A diversificação da matriz energética com fontes como a EO e
biocombustíveis de microalgas, e o investimento em inovações tecnológicas,
posicionarão o Brasil como um "exemplo de economia de baixo carbono do
mundo".
Fontes:
"Estudo Cadeia de Valor: Energia Eólica Offshore - ABEEólica"
(Dezembro de 2022)
"O Boom no mercado offshore de petróleo do Brasil pode significar
perigo, afirma jornalista norte-americano"
"O IMPACTO AMBIENTAL DA EXPLORAÇÃO DE PETRÓLEO OFFSHORE NO BRASIL E
MEIOS ALTERNATIVOS AO SEU USO - Universidade Federal Fluminense"
(2023)
"O que são as offshores no mundo do petróleo? - INBEC" (Atualizado
em 13/04/2023)
"Produção offshore no Brasil: - PPSA" (2023)
0 Comentários